Dia Internacional das Pessoas Não-Binárias
Passado um ano depois da nossa última postagem sobre não-binaridade e refletindo sobre representatividade, levantamos o questionamento: Okay, mas quando nós vamos ter personagens não-binários que não são “shapeshifters”?
Para quem não sabe, “shape shift” ou “mudança de forma” é o mesmo tipo de super poder da Mística, em X-men. A questão é que, quando falamos de representatividade não-binária, especialmente na animação, esses seres de forma fluída são geralmente os que representam as pessoas não binárias. Temos como exemplo: Double-trouble (She-ra), Camilo (Encanto, “confirmado” fora do filme) e alguns outros fora da indústria da animação também. Nesse breve artigo, tentaremos refletir sobre por que esse tipo de coisa acontece e como podemos avançar para uma melhor representatividade e um entendimento melhor do que é a não-binaridade.
É provável que surja o questionamento de por que esse tipo de representatividade acaba sendo incômoda, afinal, personagens não-binários são tão raros que supostamente deveríamos aceitar absolutamente qualquer coisa. E não vou mentir que por um tempinho foi assim. Eu mesmo fiquei bem feliz quando Double Trouble apareceu em She-ra. Foi o mais perto até então de ver alguém como eu, mesmo que fosse uma espécie de ser reptiliano e vilanesco, que não tivesse muitas outras semelhanças comigo.
Muitos roteiristas parecem esquecer que shapeshifters são seres são mágicos e não binários são pessoas reais (que parecem com pessoas reais e tem problemas bem reais também). Para quem não faz parte da comunidade, a não-binaridade ainda é associada, antes de qualquer outra coisa, a androgenia. Isso acontece porque, por mais que seja explicado, as pessoas ainda não conseguem separar o conceito de identidade de gênero (como você se entende por dentro) com o de expressão de gênero (como você se expressa por fora). Não binários não devem androgenia a ninguém. Esse não é e nem pode ser, de modo algum, um requisito para que suas identidades sejam respeitadas.
Outro ponto importante, é que não-binário é um termo guarda-chuva para diversos gêneros: agênero, bigênero, genderfluid, genderqueer, demiboy, demigirl, mogais e etc. Não binaridade é simplesmente a não conformidade com o binário. Alguns se alinham mais ou masculino, alguns ao feminino, alguns ao neutro, alguns com os dois. Há mil formas diferentes de ser não binário, e nenhuma delas envolve super poderes para aparecer do jeito que se quer, sempre que se quer.
Eu entendo o appeal. Como gênero-fluído, entendo a tentação da fantasia de poder parecer mais masculino ou mais feminino ao bel prazer. Também entendo como isso também torna a mensagem mais fácil para o interlocutor. Mas até que ponto é positivo acostumarmos as pessoas que o respeito a nossa identidade tem a ver com quem aparentamos ser, e não com quem somos?